segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Lenine e o chão


Sábado, dia 27 de outubro, tivemos a honra de receber no Teatro Pedro II, em Ribeirão Preto, o talento e as inovações de Lenine, um cantor para os, minimamente informados, que dispensa apresentações.
Não é de hoje que Lenine recheia nossos ouvidos com boa música arquitetadas pelo seu amplo talento. Olhando lá atrás encontramos verdadeiras obras como A Rede, A Ponte, O homem dos olhos de raio X, Paciência, É o que me interessa.
Em É o que me interessa, podemos notar a mestria linguística de Lenine por meio dos seguintes versos: A sombra do futuro / A sobra do passado/ Assombram a paisagem. Em três palavras (sombra, sobra, Assombram), num trocadilho bem desenhado, a música se concretiza na mais alta competência verbal. Talento! Puro talento vindo de Pernambuco.
 Agora, em 2012, esse pernambucano nos cede a maravilha do cd Chão.
Unindo linguagens, o show de Lenine concebe, no útero do palco, a estética com um chão (não se trata de trocadilho com o novo álbum) forrado pelo vermelho de uma primavera que ao fundo traz sons de insetos. Juntam-se ao visual escuro, sem ser barroco, melodias e letras, que raramente abandonam a poesia. Não é à toa que encontramos a voz de Carlos Drummond de Andrade e referências a João Cabral de Melo Neto durante as músicas.
Lenine canta, dança e declama como se estivesse se aperfeiçoando para um produto final que, tomara nunca tenha conclusão, afinal, enquanto ele faz essa busca, sempre nos presenteia com belas e particulares canções.
Essa busca, de certa forma, está ilustrada em uma de suas novas músicas. É do Chão que surge a metamúsica De onde vem a canção?, um dos destaques do cd. Nessa música, o cantor se indaga e se indaga sobre a mágica do surgimento da canção. Não há resposta, apenas o privilégio do não-saber e do procurar.
Na apresentação de sábado, Lenine brilhantemente engatilhou após essa música a declamação de À procura da poesia, na voz do próprio Drummond. Observa-se que o músico faz trabalho de escultor com suas preciosidades musicais. Não estamos diante de um compositor/cantor que procura inspiração, apenas, para suas composições. Lenine é meticuloso com cada sílaba, tem preocupação estética e semântica com o que faz.
Para quem acha que a MPB é rica apenas devido ao passado, engana-se. Quem se prende aos grandes lá de trás sem querer abrir os olhos para o presente, é porque se recusa a pôr os pés no chão, que, muito próximo, encontra-se e convida a todos para uma gostosa caminhada cheia de acordes bem executados e ornados por letras extremamente poéticas.
Vitor Miranda

3 comentários:

tiao disse...

Grande show mesmo,sorte de quem sabe apreciar música de verdade...

Unknown disse...

Vitor, prometi que daria uma olhada, e dei, não só nesse último post, mas até o do show de Bonfá. Simplesmente gostei de todos. "Lenine e o chão" é uma prova de que MPB ainda tem muita qualidade. "Cartas" me deixaram com um sentimento que nunca tive, pois troquei-as apenas algumas vezes em minha vida... "Nos bailes do Milton": confesso que não conhecia muito de Milton Nascimento... ouvi "Travessia" e só posos dizer que é uma música fantástica, realmente. Quanto a "Um perfume que não perde o aroma", sempre estive para assistir, mas agora tenho a certeza que irei. Al Pacino é um dos meus atores favoritos, talvez o mais, além de ser um dos melhores. Sobre "Caravaggio no MASP" gostei da ideia que a obra "Medusa" causa, uma vez que os petrificados somos nós, ainda mais por ser fã de mitologia Grega. E "Nem foi tempo perdido..." também me identifico, uma vez que sou fã da banda Legião Urbana, apesar de não ter vivido na época de atividade da mesma. Obrigado pelos textos, continue escrevendo. Abraços.
Antônio

Vitor Miranda disse...

Antônio, obrigado pela visita e pelo comentário.
É bom ter esse retorno crítico para que eu possa saber o que manter e o que melhorar por aqui.

Abração
Vitor