sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Um segredo argentino


Estar de férias é aquele negócio: os primeiros dias são maravilhosos, puro descanso e nenhuma preocupação com a vida, com a rotina. Após esses dias iniciais, começa a se procurar o que fazer. E ontem, nessa minha procura, fui escolher um filme.
Li algumas resenhas e despertou, entre as lidas, assistir ao vencedor do Oscar 2010 (melhor filme estrangeiro) o argentino “O segredo dos seus olhos.”
Assisti. E que maravilha de filme!
O filme apresenta um caráter policial, afinal já no início se convoca um crime a ser desvendado. A partir daí, o gênero policial se desmembra no lírico, no romântico, no drama e finaliza com um desfecho surpreendente e muito agradável.
Em tempos de acentuação dos filmes de Hollywood, vale a pena sair do mundo dos filmes comerciais e dar uma chance a outros de qualidade inegável. “O segredo dos seus olhos” cumpre justamente com essa obrigação artística a que se dispõe.
Embora com um orçamento baixíssimo para uma produção cinematográfica (cerca de 2 milhões de dólares), o que temos diante da tela é a superação dessa questão que poderia ser um ponto negativo e que, no entanto, é superada por um enredo que se costura inicialmente como clichê (assassinato e criminoso foragido) e termina surpreendendo. Além disso, contribui para arte do filme as grandes interpretações dos atores, principalmente a de Ricardo Darín, que interpreta o oficial aposentado Benjamín Espósito.
Espósito, após a aposentadoria, decide escrever um romance sobre um caso em que ele trabalhou no passado. O passeio pela memória de Benjamín Espósito nos leva ao passado argentino em meio ao governo Perón, estádio de futebol, bares e ruas de Buenos Aires.
As duas horas de filme expondo o que eu escrevi acima, são duas horas que passam realmente voando, tamanha é a genialidade dessa obra. Quem não viu ainda, veja. Não haverá arrependimento.
Já fazia um bom tempo que eu não via um filme desse calibre. Espero que no restante de minhas férias eu encontre outras preciosidades iguais a essa. Um bom filme sempre é bem-vindo.
Vitor Miranda

terça-feira, 20 de julho de 2010

Imbecilidade


- Oi, Imbecilidade. De novo por aqui?

- Puxa, cara! Tenho vindo muito por estes lados. O pessoal anda me convocando bastante.

- Percebi mesmo. Acho que ontem vi você lá perto do centro.

- É bem provável. Atualmente tenho ido a muitos lugares. Sabe como é, as pessoas cada vez mais imbecis e eu cada vez melhor com isso.

- Não pensa em parar de dar as caras? Me sinto muito mal cada vez que te vejo.

- Imagina. Adoro aparecer. Para eu deixar de aparecer, você sabe muito bem que não depende de mim. Quem manda o povo ficar só fazendo asneira?

- Eu sei, mas acho que isso ainda vai durar muito. Aliás, as besteiras só aumentam.

- Adoro tudo isso.

- Claro, é o que te fortalece.

- Ontem mesmo teve um rodeio. Adivinha se apareci? Não perderia por nada ver aquele povo cheirando esterco e alguns burros montando nos cavalos.

- Sei muito bem que adora essas imbecilidades, Imbecilidade.

- Daqui a pouco teremos mais algumas coisinhas do gênero aqui.

- É? O quê?

- Ah, o de sempre. Um pessoalzinho marcou de vir hoje nesta esquina com carros e pôr o som no último. E me parece que mais tarde vão fazer um racha.

- Quanta imbecilidade!

- Sim, sem dúvida.

- Vão correr pra ver se matam ou matam alguém, aposto.

- Isso sempre acontece.

- Mas por que você veio bem antes de eles chegarem?

- Está vendo aquelas pessoas entrando e saindo daquela loja?

- Sim, e daí?

- Olha na mão delas. A maioria com um carnê enorme.

- Entendi. A imbecilidade do crediário.

- Que idiotas. Não suportam uma propaganda lhes dizendo “financiamos em até 60 vezes”.

- Propaganda vende.

- Não, não vende. Ela assalta os imbecis.

- É melhor eu ir indo. Já está quase na hora do jogo da seleção brasileira.

- Você não me engana. Bem que desconfiei.

- Desconfiou? De mim? Do quê?

- Você também é um imbecil.

Vitor Miranda

terça-feira, 13 de julho de 2010

Loucura contemporânea


É comum ouvir por aí “você está louco! Fazer isso é loucura!” Mas, enfim, o que nos permite definir o que é ou não é a loucura?

Dom Quixote era tratado como louco porque acreditava em um mundo em que a palavra e a moral eram os maiores valores humanos. A maioria, porém, não tinha a mesma postura quixotesca dele e por vezes ele apanhava ou era ridicularizado.

Hoje as loucuras mudaram, são outras. Muitos são aqueles que fazem dívidas exorbitantes e se afundam no desespero de ter que cumprir com algo fora, literalmente, de sua realidade. Tamanha loucura tem como incentivo o turbilhão de propagandas diárias despejadas na televisão, internet e rádio que procuram expor ao seu público que para ele poder ser alguém, é preciso comprar, comprar e comprar.

Talvez o consumismo seja a maior loucura do nosso século. E ela é tão grande e perigosa porque acarreta outras consequências além do indivíduo. Atinge o coletivo e põe em risco a continuidade da vida no planeta. Tamanha loucura se concretiza tendo em vista a necessidade dela para alimentar a fabricação daquilo que consumimos em excesso. Os recursos naturais estão a cada dia sendo mais e mais utilizados de maneira desenfreada. Em breve, e isso já se tornou senso comum em dizer, a escassez desses recursos se acentuará drasticamente.

Além disso, a loucura consumista produz a cada minuto avalanches de lixo, uma vez que a cada produto utilizado, sua embalagem, seus resíduos e mesmo seu desperdício se alojam no meio ambiente e interferem negativamente na terra, na água e no ar, e nem é preciso aqui dizer como eles são afetados. O olfato e o paladar nos dão a resposta.

Se a loucura é a fuga da lógica, ninguém poderá negar então que a doença consumista é, sim, uma loucura de proporções apocalípticas. Sair dela e voltar para realidade é função de cada um para que todos sejam beneficiados e não termos um planeta tão cheio de vida como Urano ou Netuno.

Vitor Miranda

domingo, 11 de julho de 2010

Criador e criatura

Em Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, uma das passagens mais memoráveis da obra é a batalha entre Dom Quixote e os moinhos de vento. Trata-se aqui de uma metáfora. Em resumo, era uma luta entre o homem e a máquina, esta vista pelo herói como monstruosos gigantes.

Naquele tempo, o moinho de vento substituía vários trabalhadores que tinham a função de moer o trigo, por exemplo. Consequentemente, esses trabalhadores perdiam seus empregos de “moedores” e deveriam procurar outro trabalho, pois os moinhos eram movidos a vento, não geravam os gastos humanos e, assim, o patrão tinha um bom negócio em mãos.

Quatro séculos depois, temos a mesma luta de Dom Quixote. Os gigantes se multiplicaram com os avanços tecnológicos.

É inegável que a tecnologia nos trouxe enormes benefícios. Conforto, praticidade e maior expectativa de vida, por exemplo, são pontos positivos que mudaram a vida da humanidade. Ocorre, porém, que os aspectos negativos muitas vezes se manifestam de modo ainda mais contundentes do que os positivos.

Um dos grandes pontos ruins da tecnologia está na automatização do trabalho. É comum vermos em vários setores máquinas trabalhando no lugar de pessoas. Os bancos, em geral, estão cada vez mais com um número menor de bancários. Isso ocorre porque um caixa-eletrônico ou serviços via-internet fazem o serviço que antes eram exclusivos dessa classe.

Essa substituição não para por aqui. Guaritas de shoppings centers, lojas vendendo produtos on line e empresas de telefonia com atendimento computadorizado são outras substituições de gente por máquina. Como alternativa alguns defendem que os empregos substituídos geram outros trabalhos para que tais desempregados se empreguem. É claro que outros empregos são criados com o avanço tecnológico, pois se há uma máquina que atende no banco é evidente que alguém a fabricou. Contudo, os empregos gerados pela fabricação de uma máquina como essa, não são proporcionais na mesma medida do número de pessoas que ela pôs na rua. Ao fazer o trabalho de dez pessoas, ela cria no máximo três outros empregos.

A substituição de criador por criatura se acentua com grande rapidez a cada dia pela preocupação maior das grandes empresas, que é o lucro. Vivemos em um sistema que para sobreviver procura sempre diminuir os gastos para que o lucro seja maior. Com isso é evidente que a troca de homem por máquina seja uma ação comum nesse âmbito. Com mais e mais pessoas sem trabalho, o custo da mão-de-obra humana abaixa e a prática do trabalho praticamente escravo se expande. Países emergentes e subdesenvolvidos como os africanos e mesmo a China são exemplos de lugares onde se produz muito e paga-se pouco aos trabalhadores que, entre eles, boa parte é de criança. São essas pessoas que possibilitam ao mercado ocidental produtos de grandes marcas para que seus clientes, por exemplo, usem um tênis da última moda. Financiamos, assim, a exploração do trabalho escravo e infantil.

Mesmo apontando e reconhecendo os benefícios da tecnologia, devemos refletir a seguinte questão: quem ela está beneficiando com conforto, praticidade e maior expectativa de vida? Na verdade, uma minoria da população mundial.

O que abastece a tecnologia é a exploração do mundo globalizado expandindo mais e mais as desigualdades sociais. Os efeitos de tamanha desigualdade e incoerência trarão consequências ainda maiores que o desemprego, isso porque este desencadeia outras mazelas. Desemprego atrai o desespero e em seguida alimenta a violência. Quem não tem, vai procurar obter de outras formas, afinal, é preciso sobreviver.

Não se vê em parte alguma o governo trabalhando com políticas que visam contornar a situação. Elegemos nossos governantes, mas eles não governam por nós. Temos uma democracia fantasiosa. Quem, de fato, dita como deve ser e não ser é o capital especulativo. As multinacionais vêm, fixam-se nos países e dão a sua cartilha para ser seguida. São simples e diretas, ou o governo age de acordo com as ideias que exigem ou vão embora. E o que oferecem? Um número mínimo de empregos para a população e o maior possível para as máquinas, pois estas não criticam o patrão, não têm férias, 13° salário, não engravidam, não vão à justiça ou filiam-se a sindicatos.

Enquanto a ditadura do dinheiro ditar as regras tecnológicas, as classes menos abastadas e sem chances reais de uma vida melhor continuarão engrossando a massa de prejudicados pela tecnologia. Em um breve futuro, não só essa classe será a prejudicada, mas sim todos nós. É preciso que rapidamente os governos e as pessoas em geral acordem para esse perigo e passem a ditar as regras ditas hoje pelas grandes multinacionais. Somente assim poderemos extrair da tecnologia o que ela realmente tem de bom e descartar seu lado ruim.

Vitor Miranda

domingo, 4 de julho de 2010

Ontem e hoje


A tecnologia melhorou a vida de muita gente e também modificou muito nossos hábitos ao longo de anos e anos de descobertas e, consequentemente, progressos tecnológicos. É difícil imaginar a vida moderna sem chuveiro elétrico, televisão e computador, por exemplo.

Por outro lado, em meio a oceanos de tecnologia, perdemos muitas coisas significativas. Diria que perdemos o romantismo em diversos hábitos. Isso ficou bastante evidente para mim ontem, quando estava em uma loja de produtos diversos em frente à seção de cds.

Lembro-me de que na minha juventude havia um gostoso hábito de ter o cd original dos artistas que eu gostava e gosto. Não havia naquela época a pirataria e nem a onda de downloads que hoje estão mais do que sacramentadas na atual geração.

Tenho alguma propriedade para falar sobre esse assunto porque vivi a minha geração e hoje compactuo com a atual fazendo muitos downloads na internet, desde músicas a filmes. Não vou dizer que acho ruim baixar músicas na rede virtual, até porque muitas vezes ela é a única opção para se encontrar álbuns que já estão fora de catálogo há muito tempo no mercado. Pensa que é fácil encontrar o primeiro cd do Chico Buarque ou Bob Dylan nas lojas? Não é.

Mas ontem o sentimento do download desapareceu durante o tempo em que fiquei a pesquisar diferentes cantores e bandas na seção musical da loja. Baixar a música unicamente exclui o sentimento maravilhoso de poder admirar o trabalho gráfico da obra do artista e mesmo ter em mãos todas as letras do respectivo cd. Além disso, é inegável discutir a qualidade do produto vindo do forno da gravadora comparado a uma cópia baixada na internet.

Sei também que há a questão do senso comum em dizer: “cd original é caro, prefiro o pirata ou baixar.” Nem sempre isso é verdade. Comprei ontem a R$9,90 o último cd do Oasis, obra de ótima qualidade musical e gráfica dos irmãos Gallagher. (pena que a banda acabou este ano)

É muito claro que os tempos são outros, como já dizia o grande bardo lusitano Camões “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, mas às vezes é muito bom relembrar o tempo em que download era apenas tema para filme de ficção científica e que ter o álbum dos nossos artistas é motivo de prazer e deleite para os ouvidos e olhos.

P.S.: Guardo com carinho minha coleção original de cds do Legião Urbana.

Vitor Miranda

sábado, 26 de junho de 2010

Tirinhas


Sem titubear, responda: há algum valor em termos de qualidade textual nas tirinnhas?

É evidente que sim.

É notável que cada vez mais elas estão presentes nos principais jornais do país, em livros didáticos e também em vários exercícios de vestibulares. Isso só prova seu caráter de qualidade e importância.

A tirinha apresentada no início desse texto corresponde ao personagem Calvin e foi publicada neste sábado (26/06/2010) no jornal O Estado de S. Paulo.

Nela podemos destacar alguns pontos interessantes, principalmente para professores de língua portuguesa: o conteúdo e a linguagem.

Observamos nela que ela pode ser um ponto de partida para uma interessante aula de interpretação de texto, inicialmente. Dela podemos extrair dois assuntos muito pertinentes na atualidade: o primeiro é a televisão, o segundo, a família.

Notamos que a preocupação maior pela televisão está na criança, aqui representada pelo menino Calvin. Para ele, o jantar não importa assim como a televisão. Isso ocorre, e cada vez com maior frequência, porque várias técnicas são utilizadas para atraí-las. Primeiramente, é mais fácil convencê-las por se tratar de um público sem muita capacidade para discernir o que é bom ou ruim. Segundo porque, como diz Calvin, um monte de gente faz isso (ver tv durante o jantar). A criança é aquela história: “macaquinho vê, macaquinho faz”. Ela ao ver outros fazerem, também quer fazer, num claro exemplo da sua enorme fragilidade em ser manipulada.

Outra temática apresentada nessa tirinha é a respeito da família. Aqui podemos relacionar o aspecto televisão / família. Enquanto o pai considera que o jantar é uma oportunidade de relacionamento familiar, a criança não dá a mínima para isso. O que ela não quer perder de maneira alguma é o seu programa.

O discurso do pai parece ser de um psicólogo. Vemos que o autor da tirinha dá a voz de um especialista no assunto (relações familiares) ao pai para educar o filho, demonstrando a ele valores importantes da convivência familiar.

Um outro aspecto importante dessa tirinha é a linguagem. Temos uma situação banal, o jantar, e nela há uma representatividade do coloquialismo. Vemos que há o uso intenso de locuções verbais, termos informais (a gente) e a quebra da regência verbal do verbo “assistir”.

Podemos atribuir esse uso linguístico a dois fatores: primeiro à situação informal da família ligada ao local em que estão, segundo à criança, que em sua formação vai aprendendo a usar os dois aspectos da linguagem verbal, a formalidade e a informalidade.

Portanto, é cada vez mais explícito que as tirinhas são de grande importância como elemento de expressão linguística e até de questões sociais. Além disso, não precisamos lê-las exclusivamente com uma intenção didática e pedagógica, podemos encará-las também como uma diversão, afinal, fazer rir também é um dos seus propósitos. E rir, meus amigos, não faz mal a ninguém.

Vitor Miranda

sábado, 19 de junho de 2010

Saramago


Meu primeiro contato com a obra de José Saramago aconteceu na faculdade. Foi no meu curso de Letras em que li “Ensaio sobre a cegueira”. Um aluno de terceiro ano, tendo em mãos um autor que não obedece às formas convencionais de pontuação e escrita, além de uma obra que reflete aquilo de pior na humanidade, foi um choque. Choque artístico que me deu uma cicatriz na alma que jamais se apagará.

Ontem, Saramago nos deixou fisicamente. É uma tristeza. Porém podemos amenizá-la abrindo uma obra sua e entregar-nos a reflexões políticas e existencialistas.

A Língua Portuguesa, como sabemos, é pouco conhecida no mundo e apreciada. Sem dúvida, Saramago, único autor em Língua Portuguesa ganhador do Nobel de Literatura, elevou no planeta nosso rico e belo idioma. Depois dele, somos um pouco melhor vistos nessa questão. Ele, um clássico e moderno, provou que o talento e uma boa ideia partindo de uma análise extremamente crítica e muitas vezes extraída de um fato banal, podem elevar qualquer elemento desconhecido e dele descobrir uma essência que até então não víamos. Isso é Arte! Não há dúvida.

Só talentosos iguais a ele são possíveis de expor que a partir de um elefante ou de uma cegueira enxergue-se um conflito existencialista. Além disso, sua outra grande obra “As Intermitências da Morte” serve para que observemos a morte nossa e dele, por que não, de um prisma que foge ao senso comum da excessiva tristeza. Ela é necessária e muitas vezes um alívio.

Outra coisa em Saramago que pode ser comprovada durante toda a sua vida foi a fidelidade aos princípios ideológicos. Hoje, isso é quase inexistente. Em uma era de globalização em que estar à frente e vencer sem medir consequências é lei universal, vemos que as ideologias vão se sepultando à medida que são literalmente compradas. Porém ao longo de seus 87 anos, José Saramago mostrou-se, numa lucidez invejável para a idade, que ainda é possível crer numa ideia e defendê-la bem argumentada com unhas e dentes do princípio ao fim, independente das opiniões alheias.

Olhar para a vasta obra desse escritor lusitano é se deparar com o talento ilimitado que o habitava. Mesmo fazendo a mais fina Arte, ele extrapolou e dela tiramos política, religião, economia, existencialismo, filosofia... enfim, nos deparamos com tudo aquilo que estava em sua mente e por consequência posto brilhantemente no papel.

Saramago, obrigado por tanta beleza literária nos deixada.

Vitor Miranda

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Que país é este?

Hoje no Brasil por onde se passa é quase certeza de se encontrar uma bandeira ou pessoas trajando o verde-amarelo. A febre da Copa do Mundo contaminou quase todos. É comum ouvir de muitos que estão torcendo pela “nossa” seleção dizer: “sou patriota, amo meu país”.

Confesso que tal ideia não me seduziu nem um pouquinho. Não estou torcendo pelo Brasil na Copa e mesmo assim me considero brasileiro como outro qualquer nascido por aqui.

Patriota confesso que nunca fui, muito menos ufanista, principalmente se a questão é futebol. Não estou torcendo pelo time do Dunga por vários fatores, desde ideológicos a administrativos.

A overdose do verde-amarelo tem me causado várias repulsas. Falar que futebol é alienação é chover no molhado, especialmente hoje em dia. Somos bombardeados constantemente por inúmeras propagandas do faça isso, seja isso, use isso, seja guerreiro, viva a seleção, salve a seleção... Pois bem, isso tudo embaça o pensamento realista e faz com que se acredite que os 23 jogadores que nos “representam” e fingem que cantam o hino nacional, são, de fato, a honra de nosso país e defensores do nome do Brasil. Não são!

Futebol há um bom tempo é um negócio altamente financeiro. O que importa para a maioria dos envolvidos é fazer dinheiro. Há interesses em quem é o convocado, quem dará a entrevista e quem será vendido. Todos os jogadores, ou boa parte deles, têm como primeiro sonho ir embora dessa terra que eles “amam” e defender o interesse FINANCEIRO pessoal na Europa. Isso mesmo, a maioria de nossos apaixonados pela terra Brasil querem ou já moram na Europa. O amor maior que têm pela pátria é para se promoverem e conseguirem um contrato mais rentável no Velho Mundo.

Quanto aos nossos dirigentes, aqueles que estão há décadas nos altos cargos, estão a cada ano se enriquecendo e dando as ordens nos bastidores e no campo. Adoram tanto nosso país que quando há amistoso, mesmo sendo mandante, nossa seleção joga na Inglaterra, Estados Unidos, México...

Fingimos que os patrocinadores não comandam, que o critério de convocação é técnico e democrático. O resultado? Uma seleção repleta de jogadores que não jogariam nem nas piores equipes que disputam o mundial. Lembram-se do Hulk, do Afonso? Pois é, tiveram a chance que gratas revelações como os santistas Neymar e Ganso não tiveram na seleção canarinho.

Enquanto isso, ao limitarmos que patriotismo é futebol, esquecemos as eleições federais e estaduais que teremos em alguns meses. Deixamos de lado questões sociais e nem lembramos que a Educação e Saúde, por exemplo, vão caindo no abismo da precariedade. Agimos na fantasia do futebol para expor ao mundo que alguma coisa por aqui funciona e é exemplo para o mundo. E às vezes isso ocorre, pena que é efêmero e a realidade é outra.

Não pintarei meu rosto de verde-amarelo e muito menos vestirei uma roupa homenageando a nossa seleção europeia-brasileira. Mesmo sendo taxado como o do contra e chato, prefiro não contribuir ao pão e circo futebolístico a que muitos explicitamente aderiram.

Futebol é um jogo, a realidade, não.

Vitor Miranda

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Necessidades textuais


A área de Língua Portuguesa nas escolas tem como preocupação no ensino o desenvolvimento da linguagem, leitura e escrita. Isso para uma pessoa um pouco esclarecida não é nenhuma novidade, como também não é novidade que para se formar um aluno produtor de bons textos, antes ele deve ser um leitor, de preferência, de bons textos.
Penso que na atualidade os jovens, mais do que nunca, estão precisando de bons textos para que desenvolvam tanto sua competência linguística, interpretativa e de produção textual. Essa necessidade de leituras de qualidade se dá pelo fato do bombardeio de textos, verbais e principalmente não-verbais, geralmente de conteúdos vagos ou mesmo nulos.
Quando o jovem acessa a internet, o bombardeio começa. Páginas de autoridade duvidosa, sites de relacionamento e bate-papo virtual são mananciais de “lixo informativo e comunicativo”. É possível encontrar adolescentes aos milhares participando de grupos de discussão, os chamados fóruns, a respeito de temas os mais banais possíveis. Entre tanta banalidade, se encontram temas como: “nunca morri, detesto acordar cedo, minha cidade tem semáforo” e por aí afora.

Tanta sucata virtual acaba por influenciar o pensamento e a linguagem. Aquele se configura na alienação e atrofiamento do pensar, enquanto esta se torna um rebuscamento moderno que daria inveja a qualquer poeta barroco, tamanha a dificuldade de se entender a mensagem que se quer passar.
Palavras que exigem o mínimo de compreensão como, por exemplo, “você”, se transfigura num mísero e pobre “v”. Isso mesmo! Usa-se apenas a primeira letra para “tentar” passar o sentido da palavra. E o engraçado é que muitas vezes nem quem a utiliza diariamente consegue decodificá-la.
Muita gente liberal diz que isso não possui nada de negativo. Dizem que a molecada está falando com seu próprio código, porém já pode ser comprovado que tal pensamento em grande parte é errôneo. Muitos jovens já estão transportando tal código para textos formais, os quais não permitem tamanha modernização linguística.

Uma outra fonte de prejuízo está na televisão. Cada vez mais há programas repetitivos (novelas maniqueístas e séries enlatadas abordando a violência entre o mocinho e o bandido) e sem nenhuma pretensão educacional ou cultural.

No Brasil, os reality shows estão na moda. Vigiar a vida alheia e decidir se o fulano deve ou não ganhar o prêmio tornou-se uma diversão e dever de muitos brasileiros. Afinal, no dia seguinte não interessa saber quem ganhou o Nobel da Paz ou de Literatura, o político que desviou dinheiro público ou se o planeta está mais poluído. Ora essa, o que interessa é saber se A ou B foi eliminado do programa. Não saber quem foi o vencedor ou eliminado é como se uma parte da vida tivesse se perdido.

Na escola, então, o que resta ao professor que ainda heroicamente tenta transformar seu aluno em leitor e produtor de texto? A ele sobrou um tempo mínimo de cinco aulas semanais, em média, para lutar contra um sistema covarde “cultural” que usufrui mais de dez horas do nosso jovem, promissor, crítico e cidadão brasileiro. Um longo tempo de palavras e imagens que compõem informações na sua maioria insignificantes.

Com o pouco tempo, o professor deve insistir para que seu pupilo se dedique a Machado de Assis, Fernando Pessoa, Manuel Bandeira e, consequentemente, esboce seu pensamento crítico e redija textos coesivos e coerentes, dignos de prazer para quem os lê.
Mantendo um pequeníssimo fio de esperança, fico na expectativa de que o quadro mude. Torço para que um dia nossos comandantes percebam que ainda há tempo de salvar o barco. Os obstáculos estão cada vez mais próximos e poderosos, mas com um mínimo de reflexão é possível enxergá-los e desviar para o caminho de mares nunca dantes navegados, porém cheios de riqueza cultural e humana.

Vitor Miranda

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Vamos comemorar como idiotas


Que falta nesta cidade?... Verdade.
Que mais por sua desonra?... Honra.
Falta mais que se lhe ponha?... Vergonha.

Os versos acima, do poeta Gregório de Matos, ilustram bem os 61 anos de Serrana, SP. Nossa cidade completa nesta sábado (10) 61 anos e, infelizmente, como presente já recebeu ruas repletas de buracos e obras iniciadas e paralisadas, principalmente a Serafim do Bem. Esta, diga-se de passagem, fica no centro.

O que é difícil de entender é o porquê de se conseguir facilmente verba para shows caríssimos e por outro lado não ocorrer o mesmo para obras que trariam muitos benefícios para a população.

Vivemos hoje uma política serranense com excessos de blá-blá-blás e pouquíssimas práticas. Não se vê resultado em quase nada por aqui. Há problemas enormes com a saúde, educação e trânsito, por exemplo.

Às vezes para uma simples extração de dentes agenda-se para daqui um mês ou mais e alguns remédios básicos e até de baixos custos não são encontrados na farmácia do pronto-socorro.

A educação, que se orgulha da era da informática com suas carteiras digitais em uma das escolas municipais, hoje está há mais de um ano sem sua biblioteca municipal. Quem quiser pesquisar ou mesmo ter um livro emprestado para ler, deve procurar outra alternativa. Os alunos e outras pessoas ficam restritos a pesquisar e ler na internet. Com isso, o nível de leitores que já é baixo no Brasil e por aqui também, se compromete ainda mais. Isso porque poucos têm acesso à internet e por ela ter muitas ferramentas que dispersam a atenção dos alunos. Nossa biblioteca está entregue aos cadeados, sujeiras e a alguns cães que por lá dormem à noite.

Nosso trânsito, que por pertencer a uma cidade pequena e possuir semáforos, em tese deveria ser tranquilo, no entanto encontra atualmente alguns problemas. Os buracos, por exemplo, são desafios para quem está ao volante. Desvia-se de um, e logo na frente se encontram mais dois, três, quatro...

A rua Vicente de Paula Lima, conhecida antigamente por “rua do comércio”, perdeu boa parte de suas vendas. Com a inversão de sua direção clássica e consolidada, grande parte das vendas foi sepultada. Tal conseqüência se confirma facilmente com a maioria dos comerciantes. É raro encontrar um deles que não tenha sido prejudicado pela troca da mão da rua.

Ainda sobre trabalhos inacabados, foram colocados outros postes de semáforos em partes do município e até agora não se instalou nenhum deles. (será que é falta de verba?)

Faltando um dia para o aniversário de Serrana, até agora não vi nada que mereça, de fato, uma comemoração para os seus 61 anos. Quem sabe ao acordar amanhã ocorra uma mágica e surja ao menos um motivo.

Vitor Miranda