domingo, 4 de janeiro de 2009

Metamorfose verbal e sonora

Geralmente quando o homem busca o progresso, está buscando melhorias. O automóvel de hoje é mais confortável, o fogão de hoje é a gás, não a lenha; o relógio é digital, não é a corda, enfim, várias e várias transformações ao longo do tempo.
Assisti recentemente a duas entrevistas. Uma foi com o escritor Carlos Heitor Cony, a outra com o músico Kid Vinil, roqueiro brasileiro da década de 1980. Este falou sobre música, óbvio, aquele sobre literatura.
Chamou-me a atenção a opinião de ambos sobre o progresso de suas respectivas áreas, mais propriamente sobre os instrumentos que envolvem a música e a literatura. Sobre a literatura, o instrumento em pauta foi a velha e dinossaura máquina de escrever. Cony falou sobre o imenso trabalho que era a correção dos textos em épocas em que o computador não existia, épocas das Olivetti e outras marcas. Para quem não chegou a conhecer as máquinas de escrever, é bom que saiba que não havia nelas uma tecla que apagasse uma palavra ou letra digitada incorretamente. A tarefa de correção do escritor era feita de modo cansativo. Ou se jogava fora o texto já datilografado e fazia-se a correção, ou rabiscava-se o papel no determinado erro, embora depois o escritor escrevesse novamente seu texto em outra folha fazendo a correção em determinada palavra ou idéia escrita incorretamente.
Era comum o escritor gastar vinte ou mais folhas de papel para conseguir escrever corretamente uma. As pilhas de papel que se formavam eram comuns. Em tempo de consciência ambiental, não seria muito prudente gastar tanto papel assim.
O surgimento do computador fez com que a aposentadoria da máquina de escrever fosse decretada. Hoje com uma tecla se apaga um texto inteiro. É uma revolução que veio a ajudar o escritor e o meio ambiente. Um livro de trezentas páginas feito em uma máquina de escrever derrubava muitas árvores, o que foi diminuído com a utilização do computador para digitar os textos.
Já na música, a evolução não chega a ser tão prazerosa assim. Os discos ou vinis, os chamados “bolachões”, já não são mais usados. Aos poucos foi perdendo espaço para o cd, dvd e o mp3. Hoje é possível baixar músicas na internet antes mesmo de elas chegarem às lojas. Não há mais a expectativa que se tinha em esperar chegar o disco às lojas, fazer filas e garantir o novo disco do Eric Clapton, do Bob Dylan, só para citar dois monstros do pop mundial.
É incontestável a praticidade dos novos formatos musicais, além do fim do chiado nas músicas tornando o som delas mais claros. Mas por outro lado, ocorrem os prejuízos, não especificamente os direitos autorais, isso é uma outra história. Como já citado, há o fim da expectativa da chegada do novo álbum do artista às lojas. Fora isso, se pegarmos o trabalho gráfico das capas dos discos de antigamente, notaremos que tamanha beleza está sepultada. Muitas vezes a capa era um desafio interpretativo. Só para ficar em um exemplo, peguemos uma capa clássica: a do disco Abbey Road, dos Beatles. Nela há a sugestão da famosa lenda sobre a morte de um de seus mais célebres integrantes, Paul Mccartney.
As mudanças não param por aqui, é evidente que até o computador e os novos formatos musicais estão sujeitos a sofrerem mais progressos. O que ocorre também é que a cada progresso alguma coisa boa fica para trás. O grande problema disso tudo é que muitas vezes a qualidade do artista também muda, e para pior. As facilidades geram, em alguns casos, o comodismo. A mente deixa de trabalhar, se esforçar e a boa literatura e música ficam no passado.
O ideal seria que o progresso apenas trouxesse aquilo que realmente é bom, facilidades e bons artistas. Porém, como há sempre os dois lados, temos que saber aproveitar o que surge de positivo e guardar um espaço na memória para a saudade daquilo que se foi e que um dia foi bom, muito bom.

Vitor Miranda

2 comentários:

Marcelo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Marcelo disse...

"Guardar um espaço na memória para a saudade daquilo que se foi e que um dia foi bom, muito bom."
Ainda bem que em tudo na vida tem os dois lados. Apesar do tempo trazer ares novos, deixa a saudade daquilo que se foi. Bom né!? O que seriam das lembranças inesquecíveis se não fosse o tempo?
Outro exemplo é a internet.
Que bom que você voltou a postar Vítor. Esta é uma das, cada vez mais raras, páginas que vale a pena visitar.